O que foi dito

quarta-feira, 14 de abril de 2010

É a vida...

As minhas pernas tremiam enquanto andava. Acabava de receber a noticia de que ia morrer. O médico disse-me:
você tem três meses de vida
e o que eu ouvi foi:

vida, vida, vida, vida, vida

como o bip de uma máquina, daquelas que contam os últimos segundos de uma vida. Daquelas que se silenciam com o nascer de uma morte. Eu só conseguia pensar na morte que me esperava e na vida que nunca tive no sentido figurado e que agora deixaria de ter no sentido literal. Só pensava em todos os segundos em que apenas respirei. Em todas as coisas que não fiz porque não pude e porque não quis. Todas as conversas que tive e que foram na verdade monólogos, quer da minha parte, quer da parte de quem supostamente falava comigo.
Olho para o rio e ele parece disposto a ouvir-me. Três meses é demasiado tempo para pensar no que poderia ter sido, e pouco para de facto sê-lo. A frieza da água pela primeira vez aqueceu-me os ossos, como se esta matasse o vírus que me matava a mim.

No dia seguinte a minha mãe receberia um telefonema a avisar que tinha havido um erro nos exames, e que estava tudo bem comigo.

E pela primeira vez está.

1 comentário:

  1. Gostei deste teu texto, é exactamente o meu género :) a dor melancólica e um volte face final.

    ResponderEliminar